APRENDENDO A CAIR


Originalmente publicado na revista Vida & Yoga nº 10, de maio de 2006.

Em sua composição e execução, as posturas de Yoga, os asana(s), envolvem força, flexibilidade, equilíbrio, permanência e exploram cada uma dessas quatro características em maior ou menor grau. E quando falamos em permanência, isso significa ficar em uma postura por um determinado tempo e ir, gradativamente e dentro de limites seguros, aumentando esse tempo.

Só quem pratica sabe que isso não é fácil. É mais fácil repetir posturas, ou séries de posturas, do que permanecer em uma única por um determinado período. E dentre as várias posturas do repertório yóguico, as de equilíbrio podem ser especialmente desafiadoras. Pensando nisso, costumo dar algumas aulas para "ensinar" aos alunos a importância de se aprender a cair, pois é ótimo poder explorar seus limites dentro de uma postura de equilíbrio - como, por exemplo, a Postura da Árvore, o Vrksasana - sem medo, sem culpa, sem orgulho

Constantemente, as posturas de equilíbrio são realizadas sob forte tensão e retração musculares, simplesmente pelo receio (justificado, diga-se de passagem) do praticante de perder o equilíbrio e cair. Só que teria que ser exatamente o contrário: a expansão e firmeza concentradas da musculatura (em determinadas partes do corpo) é que deveriam estar operando durante a realização dessa postura. Veja que especificamente em Vrksasana, as pernas estão firmes enquanto que o tronco está mais relaxado. E as expressões do rosto devem estar ainda mais relaxadas e serenas. E se você pensar numa árvore natural, verá que a rigidez não pode fazer parte de sua natureza. As raízes e o tronco são positivamente firmes, mas os galhos e as folhas são flexíveis e se curvam ao sabor do vento.

Da mesma forma, no nosso dia a dia, devemos ter atitudes e comportamentos firmes e também flexíveis. Ser firme é uma coisa e ser rígido é outra. Ser flexível é uma coisa e ser sugestionável é outra. E é por isso que aprender a cair é tão importante: para mostrar que a rigidez e a sugestionabilidade são infrutíferas e muito desgastantes, seja durante a permanência numa postura de yoga, seja durante um episódio da vida.

Durante essas aulas para "aprender a cair", os praticantes caem e levantam tantas vezes quantas são necessárias. E,  nesse processo, vão descontraidamente lidando com medos, inseguranças, orgulhos, preconceitos... A partir desse contato quase lúdico, todos, a seu tempo, acabam se abrindo para possíveis, e há muito desejadas, mudanças, bem como para novos e mais conscientes comportamentos e atitudes.

O Yoga é uma visão de mundo integral e não deve ser limitada e fragmentada apenas aos horários de aulas no estúdio. A sala de prática é um modelo para a vida: um dia a gente cai e no outro, se levanta.